Um usuário entra pela primeira vez numa biblioteca. Uma porta se abre. Uma vida começa. E você é eternamente responsável por isso.
Como é fácil você ler um livro, gostar e gritar aos sete ventos que adorou e que todos precisam ler. O mundo precisa ler esse livro maravilhoso, como não? Olha só a textura dessa página, olha como esse autor escreve e ai, meu Deus, olha só essa ilustração(!!)
Quando um usuário entra pela primeira vez numa biblioteca, você tem o poder de mudar a vida dele com um livro. Você pode indicar uma leitura que, por mais simples e menos palavras que tenha, ensine a ver como a vida é bela, como o mundo é colorido e como devemos amar uns aos outros. E essa pessoa pode sair da biblioteca achando que: a) a vida é muito bela, obrigada cosmos b) a vida de todo mundo é bela, menos a minha c) sou cego.
Dizer para alguém, que um livro é bom, é algo que evito fazer. Sempre digo que “o que é bom pra mim, não pode ser bom pra você. Senta aqui e me conta do que gosta.” E ah, como isso pode ser falho. Como vou saber do que alguém precisa em uma conversa informal de 5 minutos? Como alguém vai confiar em mim em tão pouco tempo para me dizer qual é realmente o seu tipo de leitura favorito?
Uma moça entrou aqui na biblioteca. Ela tem lido quase 1 livro por dia. Ela mal fica dentro da biblioteca. Ela vem, escolhe e vai embora. Sei seu nome porque consta na ficha. Ela me pediu um livro do Nicholas Sparks. Não tinha. Ah, então me indica um, ela disse. Tenho observado suas leituras, dramas e romances estão em seu histórico. Fui até a estante e peguei um sobre mãe e filha, cuja toda a relação é baseada em recados na porta da geladeira. A mãe tem câncer. A filha sofre. Amei o livro quando li, achei sensacional, rápido e costuma funcionar para leitores que estão em fase de “fidelização” aqui na biblioteca. Ela aceitou.
Voltou. Eba.
Voltou chorando. O pai tá com câncer e não anda muito bem. Não quis pegar outro livro.
Repensei toda as minhas indicações e caramba, não indico mais livros com personagens doentes. Escondi a culpa é das estrelas lá no depósito. E só volto indicar literaturas quando souber até o RG da pessoa.
Oi Andreza, boa tarde. Sou biblioterapeuta e me identifiquei com o início do seu texto. Compartilho sua paixão pela potência e diversidade que a literatura nos oferece. Quanto à leitora que retornou chorando, este é exatamente a massa do meu trabalho: o que é evocado pela leitura. Ter apoio e coragem para acolher e dialogar com nossas angústias é vital. O humano é muito complexo para acertar na indicação. Acredito que o caminho seja como disse Bartolomeu Campos de Queirós: “Cada escuta acorda uma suspeita.” Estaremos sempre nos surpreendendo com as mais variadas reações. Se quiser conhecer mais sobre o trabalho com a biblioterapia, visite a página http://www.cristianaseixas.com. Tenho um livro publicado a respeito, o “Vivências em biblioterapia: práticas do cuidado através da literatura.” Um grande abraço, parabéns por seu caminho!
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Olá, Cristiana! Obrigada pelo seu carinho. Ainda sou estudante de biblioteconomia e biblioterapia me fascina! Vou deixar o comentário aqui, para quem se identificar também entrar em contato com você. Parabéns pelo trabalho!
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Adorei seus textos. Seu estilo. Você escreve muito bem!
Abs
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Obrigada, Francine! Fico muuuuito feliz. Beijos!
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Nem fala, amiga! Depois dessa história, fico apreensiva quando o usuário pede alguma indicação. Então já vou logo alertando, sem dar spoiler, do que ele pode encontrar na leitura. Amei o texto! Orgulho!
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Obrigada! ❤
Fiquei traumatizada? Fiquei. Mas cada tombo me faz mais forte HAUHAUAHAUAHAUAHUAHAUHA
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Oi. Andrea. Tudo bem? Conheci seu blog só agora.
Não sei se ainda tem trauma, mas pense o seguinte: está orientação foi boa q vc deu, pq a garota já estava buscando esse tipo de drama. Biblioteca é uma viagem e como toda jornada, há momentos difíceis mas q justamente nos dá amadurecimento.
Grande abraço literário
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Olá, Regina! Dizer que eu estava traumatizada foi uma “hipérbole” para contar essa história…
mas agradeço muito o seu retorno. Aprendi muito com essa situação!
Outros abraços literários e um feliz 2018!
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Ah, que legal. Eu trabalho em uma biblioteca , mas não sou bibliotecária ( na minha região está em falta). E indicar livros é uma coisa realmente complicada. Faço que nem você, quando a pessoa me pede se o livro é bom, falo que pra mim foi. Quantos leitores já chegaram para mim e falaram que odiaram o livro por ser muito triste, ou muito difícil de compreender. hahah Faz parte. Beijos :*
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